Isabela mal aguentava tanta ansiedade
pelo grande dia. Sábado estava chegando e com ele a tão aguardada festa de
quinze anos. Ela própria se encarregou de todos os preparativos: alugou o
salão, comprou os enfeites, contratou a doceira para fazer o bolo, sua tia
faria os salgados, pagou uma fortuna pela presença de um dj famoso e mandou fazer um vestido especialmente para essa data.
Em casa, não se falava de outra coisa,
se tivesse qualquer assunto a ser discutido tinha que esperar até a próxima
semana, enquanto isso o cachorro passava fome, o carro ficava parado na garagem
por falta de gasolina, o lixo permanecia dentro de casa, o quintal continuava
com as folhas secas trazidas pelo vento. O pai da aniversariante estava
preocupado, pensava se era normal tamanha agitação, mas acabou considerando o
comportamento “razoável” e que deveria apoiá-la na realização desse sonho.
A irmã de Isabela achava aquilo uma
afronta. Onde já se viu, em pleno século 21 fazer todo esse escândalo por uma
festa de quinze anos. Não conformada, se recusava a ajudar a irmã nos
preparativos. Se ela fazia questão da palhaçada, que se responsabilizasse
sozinha.
Na quinta-feira que antecedia a festa,
Yasmin e Isabela foram à loja pegar o vestido encomendado. Mãe e filha ficaram
horas em frente ao espelho, ajustando aqui, dando um ponto ali, pregando acolá.
A costureira tinha outras clientes, é verdade, mas aquelas lhe tomavam toda uma
vida com insatisfações. “Por que não
fizeram elas mesmas?”, pensava enquanto entre sorrisos fazia os caprichos das
duas.
Tadeu, sozinho em casa, esperando a
esposa e a filha voltarem da costureira, se viu perplexo ao atender a campainha
e ter que receber uma encomenda em nome de Isabella: um pônei. Sua cara de
estupefato combinava com a do entregador que levara o animal em um caminhão
adaptado mas que agora transferia a responsabilidade para o senhor congelado a
sua frente. Claro que passou pela cabeça dele não aceitar o agrado que a
debutante se deu, mas considerou que isso poderia traumatiza-la ainda mais,
então decidiu acomodar o novo mascote da família na cozinha. Para sua sorte ele
não estava com fome e dormiu feito um bebê entre a mesa e o fogão.
Dona Carosinha, a vovó, entrou em
pânico quando entrou pela porta dos fundos (ela morava na casa de trás) para
pegar um punhado de açúcar e se deparou com um cavalo deitado na casa da filha.
Gritou como se estivesse sendo esfaqueada, assustou o Tadeu e o pônei, que no
reflexo deu um coice na velha e virou a mesa de ponta cabeça. Ao chegar no
local, Tadeu já conformado com a morte da sogra se surpreendeu ao vê-la montada
no bicho enquanto este corria pelo quintal. “Muitos
anos de vaqueira, caboclo!” gritava ao genro em estado de choque que a
observava.
Chegando em casa, Yasmin e Isabella
foram recebidas por um marido/pai estressado, que reclamando de enxaqueca foi
logo se deitar, e uma vovó arretada, acariciando o pônei que dormia sobre o
sofá da sala. “Escuta, vocês vão
construir um estábulo aqui, por acaso?” Isabella disse que não, era apenas
até a sábado para a entrada na festa, depois passaria ele para frente.
E de tanto esperar, sábado chegou. Yasmin
estava encantadora, mas Isabella ofuscava qualquer uma. Não havia quem dissesse
que a festa não fosse dela. Sua entrada montando aquele “pequeno cavalo”, como
a mãe se referia, levou os convidados ao delírio. O momento da valsa, então,
foi encantador. Tadeu a encaminhou segurando-a pela mão e de forma atrapalhada
movia os pés de um lado a outro.
Carosinha, que se concentrou nas
comidas da festa, ao ir até o banheiro, ouviu um ruído. Procurou um pouco mas
logo encontrou a origem: vinha da escada, Yasmin estava chorando. “Minha filha, o que está acontecendo? Por
que não está aproveitando a sua festa?”. Com os olhos marejados e quase
soluçando, a neta respondeu: “Minha
festa, vó? A mamãe fez tudo pra ela! Eu que faço quinze anos e ela com
cinquenta quis ser a rainha, até um cavalo trouxe pra cá!”. Sem ter muito o
que dizer, Carosinha finalizou: “Sua mãe
sempre foi um problema, nunca soube superar os próprios traumas, mesmo que para
isso traumatize a filha.”