sábado, 10 de outubro de 2015

A luz

Diego era uma criança feliz. Talvez não seja possível explicar essa felicidade pois ela era muito peculiar à sua mente. Nunca saia do quarto, pequeno, circular, no alto de uma torre. Havia apenas uma janela de vidro que ia de cima à baixo na parede com grades e uma cortina vermelha. A mobília era simples, composta por uma cama pequena, uma cômoda com uma jarra d’água e bacia em cima e um tapete. Os poucos brinquedos que ele tinha ficavam jogados ao lado da porta, essa aliás, que nunca era aberta. Tudo o que comia vinha de uma passagem na parede com uma portinha de madeira aberta por fora e quando tinha que ir ao banheiro usava um vaso em frente à janela. Suas primeiras lembranças já o remontavam àquele lugar, por isso Diego não tinha parâmetro para saber se era bom ou ruim, certo ou errado, logo, ele era apenas uma criança feliz.

Seus dias passavam basicamente na janela, de onde ele via uma grande floresta cheia de árvores, uma cachoeira no meio do verde com água branca e ao fundo várias montanhas juntas. Mas o melhor mesmo era olhar para fora durante a noite. Toda a paisagem quer era encantadora durante o dia transformava-se em um grande tapete negro que servia apenas para realçar o brilho de uma luz que vinha de dentro das montanhas diretamente para os olhos admirados de Diego. Por algum motivo que desconhecia, ele ficava absolutamente apaixonado por aquela luz que sequer sabia do que se tratava e transformou aquilo no seu primeiro e único sonho na vida: ir até ela para abraça-la.

O tempo foi passando e a rotina de Diego era sempre a mesma. Acordava, pegava a comida do dia, a colocava sobre a cômoda, brincava um pouco e ia para a janela. E assim os anos foram passando, sempre feliz, sempre alimentando o mesmo sonho... Não sabia o que era família, amigos, não sabia ao menos que estava preso. Seu mundo se resumira àquele espaço, ainda assim algo dentro de seu coração queria conhecer a luz do horizonte. Quando os cabelos do corpo estavam crescidos e os da cabeça ameaçavam cair, ele começou a pensar em alguma forma de sair dali e chegar no lugar onde a luz brilhava. Passava dias inteiros pensando no que poderia fazer, até que concluiu ser mais fácil descer pela janela e atravessar a floresta. Quando decidiu que era isso, passou a refletir como fazer. Sabia que não podia pular, não pela altura, e sim pela grade. Tentou várias vezes quebra-la mas não conseguia. Depois de muitos meses buscando uma forma de cumprir o que queria, ficou triste ao perceber que não era possível transformar seu sonho em realidade. Parou de comer, parou de andar, nem olhar pela janela queria mais, já que sempre que via a luz lhe batia uma tristeza no peito.

Certo dia, porém, ao acordar, tinha algo diferente no quarto: a porta estava aberta. Admirado e ao mesmo tempo com medo, Diego levantou-se mas com receio do que acharia ficou paralisado. Sua vontade era de voltar para a cama e chorar, mas nem isso conseguia. Alguns minutos depois, mais relaxado, o pânico inicial foi substituído por uma curiosidade absurda, o que moveu suas pernas lentamente em direção ao lado de fora. Mas quanto mais próximo de sair do quarto ele estava, mais temoroso ficava e acabava recuando. Ele nunca foi de sentir medo, já que de fato não houve muitas experiências para isso, mas sabia exatamente o que estava sentindo naquele instante. Decidiu então, ir para o único lugar que o acalmava. Abriu a cortina da janela e começou a olhar para fora, em direção as montanhas e ali ficou o dia inteiro, vendo a lua chegar e com e ela o brilho da luz surgir. Diego olhava encantado, alimentando seu velho sonho e pensando em uma maneira de realiza-lo, enquanto atrás dele a porta permanecia fechada, embora estivesse aberta esperando um passo de coragem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário