sábado, 10 de outubro de 2015

Na dúvida, ligue

João saiu correndo do quarto, ainda vestindo a camisa e calçando o sapato, quase que ao mesmo tempo, mas perdeu o equilíbrio no alto da escada e acabou rolando até embaixo. Um pouco atordoado tentou levantar-se, mas não conseguia. Ainda esparramado no chão, o barulho da porta dos fundos abrindo o torturava. Ele tinha que fazer algo, ninguém podia vê-lo ali. Pensa, pensa, pensa...

Enrico tentava destrancar a porta mas não conseguia, ela parecia emperrada. Pensou em ir até a da frente, mas esquecera a chave no escritório. Enquanto tentava forçar a fechadura com um pedaço de arame ouviu um barulho vindo de dentro da casa, parecia que alguém tinha caído da escada. “O que será isso?”.

João continuava no chão, gemendo como um gato dengoso (tentava ser o mais discreto possível) tentando pensar em uma saída honrosa para aquela situação, embora nada lhe ocorrera. De repente olhou para o lado e viu um banco de madeira com algumas cartas em cima. Se arrastou até ele e com muita dificuldade sentou-se, ainda gemendo.

No lado de fora, Enrico ouviu um outro barulho estranho, esse era mais sutil, mas talvez mais intrigante. Era um miado? Desde quando tinham gatos em casa? “De repente foi ele que caiu da escada”. Ao ver que não conseguiria abrir a porta deu a volta a foi em direção à janela lateral da casa.
Sentado no banquinho, João viu uma sombra aproximando-se da cozinha e seu coração ficou ainda mais tenso. Tinha a impressão de que o vomitaria a qualquer momento. Pensa, pensa, pensa... “Que tal abrir a porta da frente?”. Teve que concordar que essa era a coisa mais lógica a imaginar e por dois segundos se martirizou por não considerar essa hipótese antes. No terceiro segundo decidiu agir, olhou para o outro lado da sala e viu uma chave na mesinha de centro. Mas como chegaria até lá?

Enrico não fora muito feliz na ideia de arrombar a própria casa, tinha que convir que aquela nunca foi sua especialidade, ainda mais usando um galho velho. Embora estivesse com a cortina fechada, pode ver uma sombra se movendo na sala. “Ah, esperto, acho que hoje teremos um gato escaldado.” Mudando a estratégia, retornou à porta dos fundos.

João já estava desesperado e decidiu se arrastar até a mesa. Além de ser uma boa forma de se locomover em seu estado, era uma maneira discreta, que não chamaria a atenção de ninguém no lado de fora. Só não esperava que sua coluna travasse bem no momento que alcançara a esperada chave.
Nos fundos da casa, Enrico tirou o celular do bolso. Olhou, olhou, e tentou destrancar a porta mais uma vez. No interior da casa, João travado olhou para o telefone ao lado da chave. Olhou, olhou e tentar ir em direção à porta mais uma vez. Nem um e nem outro foi feliz no seu objetivo. Enrico não conseguiu desmantelar a fechadura e João mal segurou na chave. A única saída para ambos era fazer uma ligação.

Exatamente quatro minutos depois chegaram dois carros da polícia na residência. Enrico foi correndo, aliviado, mas a primeira coisa que ouviu foi: “ponha as mãos atrás da cabeça, qualquer momento atiramos.” A mesma coisa ouviu João alguns instantes depois, quando um policial chutou a porta da frente. Os dois estavam presos, por invasão.

Houve a necessidade de chamar os bombeiros para remoção João da casa. Enrico continuava no carro da polícia tentando explicar sua inocência. De repente, quando saíram com uma maca, Enrico não acreditou no que viu.

“Ei! Esse é o meu filho!”

Ao ouvir isso, João estranhou: “pai?”

Um dos policiais abaixou o óculos escuros: “vocês se conhecem?”

“Por que você tentou invadir a própria casa?”

“Deixa de ser tapado menino. Esqueci a chave. Por que não falou nada e ainda fez todo aquele barulho? Pensei que fosse um bandido!”

“Eu que pensei que fosse um bandido entrando pelos fundos. Levantei correndo e cai da escada.”

“Não te chamei porque achei que estivesse na escola.”

“Hoje acordei atrasado...”

“Você merece uma surra, moleque.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário